O Château d’If e o Arquipélago do Frioul

postado em: Marseille | 17

Muito antes de imaginar vir morar na França a história do conde de Monte Cristo não me era desconhecida, tampouco Marselha. Nas minhas lembranças de infância consigo identificar minha avó falando de Marselha, mas não lembro exatamente sobre o que ela falava – sem dúvida, era sobre os sabonetes, apaixonada que ela é por eles.
Quanto ao conde de Monte Cristo, meu primeiro contato foi através do filme estrelado por Jim Caviezel, versão cinematográfica mais recente da história, que os franceses já filmaram com ninguém menos que Gérard Depardieu no papel de Edmond Dantes, versão que ainda não assisti, mas conto corrigir essa falha o mais rápido possível. Depois que me mudei pra cá e estudei um bocadinho de francês, o romance histórico escrito por Alexandre Dumas em 1844 foi o primeiro livro que li em versão original, e me apaixonei pela história e pela narrativa do autor. Tudo isso pra dizer que o início do romance é ambientado na cidade de Marselha, mais precisamente nas regiões do Porto Velho (Vieux Port) onde chega o navio no qual trabalhava Dantes, e dos Catalans, onde morava sua querida Mercedes.

Mas é em uma ilha que Edmond Dantes passa grande parte do seu tempo. Preso no Château d’If, ele entrará pra história do monumento como sendo seu único fugitivo, mesmo que tal fuga não tenha saído da ficção criada por Dumas. E por que contar essa história toda? Porque foi precisamente esse romance que tornou celébre o forte, construído entre 1527 e 1529 por François I, com o intuito de proteger a costa mediterrânea, garantir a integridade da frota real e vigiar Marselha, que foi integrada ao reino francês em 1480. O monumento serviu de prisão no período de 1580 a 1871, tendo recebido diversos presos políticos ao longo desse tempo, inclusive o misterioso prisioneiro da máscara de ferro, o preso político da época de Louis XIV cuja identidade resta desconhecida, e que figurou na trilogia dos Mosqueteiros (“Os três mosqueteiros”, “Vinte anos depois” e “O visconde de Bragelonne”), também de autor. Em 1880 o Château d’If é aberto à visitação, e o público é atraído principalmente pela curiosidade de ver de perto esse lugar imortalizado por Dumas, uma vez que o Château d’If é mais um dos vários fortes construídos ao longo do século XVI para garantir a segurança da costa e fronteiras.

 

 

 

A muralha fortificada que cerca a ilha recebeu reforço em 1604, de acordo com o projeto do engenheiro militar do rei Henri IV, Raymond de Bonnefons, e mais tarde Vauban outro engenheiro militar de grande reputação no reinado de Louis XIV, construindo fortificações para garantir a segurança das fronteiras do reino, sendo que seu trabalho em Briançon, nos Alpes franceses, é inscrito no patrimônio da Unesco. Vauban criticou a forma como o forte foi construído, classificando o trabalho como “mal feito e construído de forma muito negligente”, e as melhorias propostas pelo engenheiro e arquiteto militar proporcionaram à fortificação a configuração atual. O edifício tem três níveis: a entrada é feita atravessando uma pequena ponte levadiça sobre uma fossa seca, logo à direita fica a loja de souvenirs, seguida de uma exposição permanente sobre Alexandre Dumas e sua obra, e em outra cela uma exposição memorial com gravuras feitas nos muros no século XIX pelos revolucionários. No pátio, um poço armazenava a água da chuva, que era armazenada em outros reservatórios no edifício. Construído em ilha de calcáreo, não há porão no forte, como o imaginário pode dar a entender.

 

Vista de janela de cela no segundo andar do Château d’If

Duas celas chamam atenção do visitante nesse primeiro nível: a cela que teria sido ocupada por Edmond Dantes, o conde de Monte Cristo, e a cela ocupada pelo frei Faria, com quem Dantes se comunicava através de um buraco na parede da cela, buraco que pode ser visto, junto com imagens do filme estrelado por Depardieu. No segundo nível, uma exposição sobre o romance de Dumas conta como foi a repercussão  da publicação mundo afora, cartazes de peças inspiradas no romance, além de mais imagens do filme, e ainda apresenta o caso no qual Dumas teria se inspirado para criar a intriga que leva Dantes à prisão, caso registrado pela polícia de Nîmes. É neste nível que vemos também a cela ocupada pelo prisioneiro da máscara de ferro, localizada logo acima da porta de entrada do forte. Contrariamente ao que vemos no primeiro nível, as celas do segundo andar contam com janelas e o pé direito é mais elevado.

 

 

Cela que teria sido ocupada por Edmond Dantes no romance de Dumas

Do terraço podemos ter uma vista panorâmica da cidade de Marselha e das ilhas do arquipélago de Frioul, e na torre mais alta, que era usada para observação pelos guardas, o piso foi projetado de maneira cilíndrica, e quando nos posicionamos bem no meio e falamos em voz alta, nossa voz ecoa de maneira interessante pela torre, vale fazer a experiência! O passeio na ilha e a visita ao Château d’If dura entre 45 minutos e 1h30, há uma pequena lanchonete no local e animais só são aceitos no exterior, sua entrada ao forte sendo proibida.

Marselha vista do terraço do Château d’If. Na colina, Notre-Dame-de-la-Garde.

 

Ilhas do arquipélago de Frioul vistas do terraço do Château d’If.

Informações práticas: Acesso ao Château d’If e tarifas

O acesso ao Château d’If é feito de barco com saída do Vieux Port (Porto Velho) e existem duas opções de bilhete (os horários variam de acordo com a época do ano, verifique no site. Em caso de vento, ligue para confirmar o trajeto até a ilha d’If, que costuma ser suspenso. Verifique no site do Château d’If se ele está aberto antes de ir ao porto:
– bilhete ida e volta uma ilha – ilha d’If OU ilhas do Frioul – 11,10€ individual ou 7,60€ o bilhete na tarifa família (mínimo 4 pessoas, sendo uma criança entre 4 e 12 anos);
bilhete ida e volta duas ilhas: 16,70€ tarifa individual
trajeto simples (para quem se hospeda nas ilhas do Frioul) 5,70€.

Tarifa de entrada ao Château d’If:
6€ tarifa normal e 4,50€ tarifa reduzida. Entrada gratuita para os menores de 18 anos, cidadãos europeus entre 18-25 anos, portador de deficiência física e seu acompanhante.

  • Horários de funcionamento: 
  • 2 janeiro a 1 abril: todos os dias exceto segundas de 10 às 17h
  • 2 abril a 30 de setembro: todos os dias de 10h às 18h
  • 2 outubro a 31 dezembro: todos os dias de 10h às 17h

 

 

Arquipélago do Frioul

O passeio às demais ilhas do arquipélago de Frioul pode completamentar a visita ao Château d’If, principalmente no verão quando os dias são mais longos e um banho de mar é bem-vindo. As praias calmas e pouco frequentadas das ilhas, com águas transparentes onde vemos facilmente cardumes de diferentes espécies que atraem belas gaivotas, são um atrativo para quem procura tranquilidade à beira do mar. Já no porto somos recepcionados por cardumes, que costumam nadar junto às rochas. Vale lembrar que o arquipélago é área de proteção ambiental, o que facilita o encontro com a fauna local.

É no porto também que ficam os restaurantes e lanchonetes, e de onde sai um trenzinho que garante o transporte entre o porto e a praia de Saint-Estève, a cerca de 10 minutos de caminhada. Se a visita for feita fora do verão, conte cerca de 4 horas para conhecer todo o arquipélago, contando o tempo dispensado à visita ao Château d’If e ao entorno da pequena ilha onde ele se encontra.

 

 

Praia na Calanque de Morgeret, nas ilhas do Frioul.

 

17 Responses

  1. Giselle Gurgel

    Adorei esse post! Tb vi somente a versão mais nova do filme Conde de Monte Cristo e lembro de achar as imagens super lindas. Desconhecia que o Homem da Máscara de Ferro era também escrito por Dumas, olha que vergonha! Mas é uma paisagem admirável e obrigada por me contextualizar com o forte!

  2. Natalia Itabayana Junqueira de Mattos

    Giselle, vou te desiludir se disser que o filme com Jim Caviezel não é filmado nem num set parecido com Marselha? Depois que mudei pra ca e visitei o Château, assisti novamente o filme, e fiquei decepcionada que nem o Château eles reproduziram… Por isso quero assistir a versão francesa!

  3. Raquel

    Interessante como eles utilizaram a literatura pra agregar valor turístico ao forte. Geralmente é só uma menção de um fato importante que aconteceu e ponto final. Disponibilizaram até o caso que inspirou a intriga! É muito legal isso! A gente precisa aprender a fazer isso aqui no Brasil!

    Marselha é muito azul… Eu sempre fico tentando imaginar como era a rotina nesses lugares (nesse forte, no caso) a 200, 300, 400 anos atras (vicio de historiador né…). Geralmente nos filmes, eles mostram um lugar sujo, escuro e umido. Mas esse forte ai… Devia ser mesmo sujo (para nossos padroes atuais), mas olha essa iluminaçao! Esse azul todo!

    Sua fotos sao otimas!

  4. Natalia Itabayana Junqueira de Mattos

    Oi Raquel, fico feliz que tenha gostado das fotos! Acho que estamos melhorando em termos de integração de historia ao patrimônio, e acredito que deveria ser o foco principal (fala a pessoa que cogitou se inscrever no curso de historia quando terminou o ensino médio).

    A estratégia deles foi realmente muito boa! Eu gosto muito de historia e de romances, então foi facil me apaixonar pela narrativa do Dumas, que une os dois de maneira sublime!

    Marselha é realmente muito azul, tanto que quando o dia fica nublado, o marselhês reclama logo, e como se o dia feio estivesse assim ha tempos!

    O que eu imagino sempre durante minhas visitas a esse tipo de lugar eram as condições de vida durante o inverno. Num castelo sabe-se que existiam os tecidos que revestiam as paredes e ajudavam a manter o frio longe, junto com as lareiras, mas numa prisão o conforto era a ultima preocupação. Penso especialmente nos dias que o mistral sopra, é um vento muito forte, seco e gelado no inverno, que desestabiliza os animais e qualquer pessoal que tenha que tenha que sair de casa no inverno, e ele é especialmente forte no litoral, agitando o mediterrâneo ao ponto de garantir ondas elevadas, que normalmente ele não tem.

  5. anaaudun

    Tudo de bom esse post já li o livro e vi o filme, mas nunca nem tinha me passado pelos pensamentos a possibilidade de visitar o lugar.
    Entrou para a minha bucket list.
    🙂 Merci.

  6. Anônimo

    preciso! eu e meu marido iremos em final de agosto com começo de setembro a um crueiro. passaremos pelo porto de la goulette, onde desceremos. como somos apaixonados pela estoria/historia do conde de montecristo, nao podemos deixar de conhecer o chateau d'if. será que teremos a sorte de conhece-lo? ficaremos em marselha durante 6 horas. espero que dê tempo…é a nossa prioridade. o post está ótimo, parabens. abraços! lenita e fabio

  7. Natalia Itabayana

    Acho que vale a pena dar uma volta pelo arquipélago, mas se o tempo for curto, visite apenas o castelo, é possível sim. Todas as fotos que ilustram o post foram tiradas nas ilhas de Frioul, que são bem bonitas e de onde se tem uma bela vista da cidade de Marseille, além de ter praias tranquilas.

  8. Tayla Zeitoum

    Natalia..adorei seus posts! Irei para Marselle em breve e quero muito visitar o Chateau..esse link que vc indicou para o bilhete até lá, não está abrindo .. 🙁
    por gentileza, vc poderia me indicar como comprar o bilhete, quais os horários de ida de volta do porto de marselle e quais são as duas ilhas mencionadas ( ficam aos arredores do chateau, é isso? vale a pena vistar as duas?)
    Obrigada
    beijo
    tayla

    taylaribeiro@gmail.com

  9. Natalia Itabayana

    Oi Tayla!
    Atualizei os links do post, agora vai direto pra página da empresa com o quadro de horários e link pra compra do ticket on-line.

  10. Luciana Bley

    Oi Natalia, vou estar em Marselha dia 21/07/2018, terei apenas algumas horas livres, pois meu trem chega as 15:35 e meu vôo à Barcelona sai as 22:15, gostaria de aproveitar este tempo indo ao Castelo de If e depois ao Arquipélogo de Frioli, vi que a visita no Castelo é somente até as 18:15, tem como ir ao arquipélago após este horário?

    • Natalia Itabayana

      Ei Luciana! Em geral os barcos que fazem o trajeto até o Château d’If vão também pra ilha de Frioul, e após o fechamento o do monumento os barcos continuam até depois das 21h

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