Tragédias e discursos

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Toulouse, conhecida como cidade rosa pela cor de seus edifícios em tijolinhos ganham com a luz do sol, foi cenário de uma tragédia que ganhou a primeira página de jornais mundo afora. Nenhum pai ou mãe, ao levar seu filho à escola, espera receber a notícia de que sua criança não voltará mais para casa, suas descobertas do dia não serão mais contadas na hora do jantar, suas risadas não invadirão mais os cômodos da casa. Nenhum pais ou mãe espera também que seu filho vai sair de casa um belo dia e cometer uma atrocidade. E portanto foi isso que aconteceu em Montauban em 11 de março de 2012 com a morte de 3 militares, e em Toulouse no dia 15 de março de 2012, quando 3 crianças e um professor foram friamente mortos na frente da escola. Uma pessoa que decide tirar a vida de outras pessoas.

E então aparecem os discursos e explicações. A religião que o assassino professa, sua origem, sua história, tudo isso pra tentar explicar o inexplicável, tentar entender o horror do acontecido, talvez uma tentativa de amenizar a dor, a incompreensão, a revolta diante de um fato que, após acontecido, toma ares de algo que poderia ter sido evitado.

Será que agora é o momento de afirmar que tais tragédias poderiam ser evitadas? Será que apontar dedos e atribuir a culpa à tal religião, à tal etnia deve ser o caminho à seguir? Hesitei em ver os jornais na tv, a ler as notícias na internet, mas não podemos nos abstrair da realidade dessa forma, e quando liguei a tv e vi as cenas do aparato policial em torno do prédio do suspeito, não pude deixar de pensar no caso do ônibus 174 no Rio em 2000, do caso Eloá em 2008, da tragédia em Realengo em 2011. Ora, existem diferenças, mas a essência é a mesma: são tragédias que nos desestabilizam e que abalam nosso dia-a-dia. E inevitavelmente são transformadas em bandeiras de causas políticas, mesmo se os candidatos à presidência da república aqui na França afirmaram que o fato não deveria ser “instrumentalizado”…

E parece que é exatamente o oposto do que foi dito que está sendo feito. Dedos são apontados da esquerda para a direita e vice-versa, passando pelos extremos mais radicais. O suspeito, que agora tem uma ficha que inclui nome em lista negra dos aeroportos americanos, não foi capturado, não pela polícia, nem pela justiça. Mais uma mãe que enterra um filho, mas o sentimento de impunidade cresce, e agora os dedos se apontam e direção ao irmão do autor da tragédia.

No mesmo dia em que os noticiários transmitiam o cerco ao suspeito e os funerais das vitimas, a menção de outra tragédia de dias antes vem encerrar a triste emissão jornalística da noite: o acidente com o ônibus que transportava um grupo de estudantes em férias de ski e as homenagens feitas pelas famílias e amigos. A reação à esta tragédia também foi a de procurar os culpados, de apontar dedos. Falar que tragédias como essas poderiam ter sido evitadas não parece ser a maneira mais respeituosa de reconfortar as famílias envolvidas, mas é uma forma de lidar com nossa impotência diante de situações que fogem ao nosso controle.

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